Estamos vivendo um tempo muito promissor para pessoas que vivem com doenças crônicas. Nos últimos anos, os avanços terapêuticos mudaram completamente a perspectiva das doenças cardíacas e condições como diabetes e asma, além da minha área de interesse - as doenças oculares. Graças, em grande parte, a melhores medicamentos, frequentemente é possível reduzir a carga de sintomas e melhorar os resultados a um nível inimaginável há apenas algumas décadas. No entanto, esses benefícios só são realizados por completo quando os tratamentos são seguidos conforme planejado. Surpreendentemente, apenas cerca de 50% das pessoas que sofrem de doenças crônicas obedecem aos planos de tratamento.1
Em termos médicos, o conceito de seguir à risca o tratamento é conhecido como ‘adesão’. O termo indica em que medida o comportamento da pessoa corresponde às recomendações discutidas com o médico (por exemplo, relativas a medicações e mudanças no estilo de vida). A adesão é uma parceria dinâmica entre o médico e o paciente - é mais provável o paciente aderir ao plano de tratamento se for envolvido pelo médico no processo e nas decisões e se tiver o apoio do sistema como um todo.1
"Surpreendentemente, apenas cerca de 50% das pessoas que sofrem de doenças crônicas obedecem aos planos de tratamento."
A adesão é o fator isolado mais importante para se alcançar o melhor resultado possível em todas as doenças crônicas. Uma boa adesão maximiza a eficácia do tratamento enquanto a má adesão é a principal razão para maus resultados terapêuticos.1
Como especialista em retina, eu vejo isso ocorrer em primeira mão nas doenças oculares como a degeneração macular relacionada à idade com neovascularização (DMRIn), a retinopatia diabética (RD) e o edema macular diabético (EMD). Essas doenças podem causar uma deficiência visual severa ou mesmo cegueira, mas é totalmente possível evitar esses desfechos com uma combinação de detecção e intervenção precoces. Nos EUA, 25% dos casos de deficiência visual são devidos a doenças oculares tratáveis.2 É trágico saber que tantas pessoas poderiam ser tratadas dessas doenças, se tivessem acesso e procurassem cuidados médicos.
Na DMRIn, por exemplo, 1 em cada 5 pacientes não demonstra adesão.3 Entre pessoas com EMD, a subutilização dos recursos da saúde é um problema bem documentado e quase metade dos pacientes dizem passar mais de um ano sem receber cuidados relacionados com os olhos.4 A Organização Mundial da Saúde, no seu documento “Saúde ocular universal: um plano de ação global para 2014-2019” enfatiza a importância crítica dos exames oftalmológicos rotineiros e das intervenções precoces para minimizar a perda da visão e otimizar os resultados em pessoas com doenças oculares.5
"A adesão é o fator isolado mais importante para se alcançar o melhor resultado possível em todas as doenças crônicas."
Considerando a clara importância da adesão, porque ela continua sendo um problema tão desafiador? A resposta é que se trata de uma questão complicada, com muitos fatores em jogo.
Eis alguns dos principais fatores que podem ter impacto na adesão, no sentido positivo ou negativo:1
Fatores socioeconômicos
As barreiras socioeconômicas à adesão incluem limitação de renda, baixo nível de escolaridade, condições de vida instáveis, falta de apoio social ou familiar, problemas de transporte e crenças equivocadas acerca da doença e do tratamento.
Sistemas de saúde
Médicos, enfermeiros, além de convênios médico, governos e outros provedores locais de serviços de saúde, todos têm um papel a desempenhar. Algumas questões potenciais incluem a falta de treinamento no manejo de doenças crônicas e uma infraestrutura mal coordenada.
Fatores relacionados à doença
Os fatores relacionados à própria doença que podem afetar a adesão incluem a velocidade de progressão da doença, o grau de severidade dos sintomas e a presença de comorbidades.
Fatores relacionados ao tratamento
Mesmo com terapias altamente eficazes, a adesão pode ser afetada por fatores como a complexidade e a duração do tratamento, a percepção de benefícios imediatos, efeitos colaterais e insucesso de tratamentos anteriores. Na oftalmologia, por exemplo, a carga do tratamento é um problema importante porque certos tratamentos exigem frequentes consultas médicas e injeções no olho.
Fatores relacionados ao paciente
A atitude da pessoa, os seus recursos, conhecimentos, crenças, percepções e expectativas podem, todos, afetar a adesão. As barreiras incluem frustração com o sistema de saúde, medo da dependência, baixa expectativa e ceticismo quanto a produtos químicos e biotecnologia.
Melhorar a adesão requer o compromisso de todos os interessados: pacientes, profissionais de saúde, indústria e legisladores.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o foco em intervenções específicas para remover barreiras à adesão, com estratégias como realocação de recursos do sistema de saúde, consultas mais longas, troca de informações e comunicação permanente entre médico e paciente. Além disso, novas tecnologias podem ser usadas para educar e alinhar o conhecimento às ações recomendadas.1
Na Roche, estamos pesquisando ativamente meios de melhorar a adesão. Nossa equipe de oftalmologia está especialmente interessada em reduzir a carga do tratamento associada a certos medicamentos para doenças oculares.
Seguir o tratamento no curso evolutivo de uma doença crônica não é tarefa simples. Mas é crucial, dada a ampla variedade de tratamentos eficazes disponíveis atualmente e as crescentes evidências que apontam para a importância da adesão. Com os nossos esforços combinados, podemos realmente cumprir o nosso propósito de levar medicamentos que fazem diferença para a vida de todas as pessoas com doenças crônicas.
Este artigo foi publicado anteriormente em
Referências
World Health Organization. Adherence to Long-Term Therapies: Evidence for Action. [Internet; citado em novembro de 2018].
Disponível em:
World Health Organization. Blindness and vision impairment. [Internet; citado em novembro de 2018].
Disponível em:
Droege KM, Muelther PS, et al. Adherence to ranibizumab treatment for neovascular age-related macular degeneration in real life. Graefe's Archive for Clinical and Experimental Ophthalmology. 2013; 251:1281-1284.
Bressler N, et al. Underuse of the health care system by persons with diabetes mellitus and diabetic macular edema in the United States. JAMA Ophthalmol. 2014; 132:168-173.
World Health Organisation. Universal eye health: a global action plan 2014-2019. [Internet; citado em novembro de 2018].
Disponível em: http://www.who.int/blindness/AP2014_19_English.pdf?ua=1.